
O primeiro assunto que eu comentarei em meu blog é a construção do novo aterro sanitário em Ponta Grossa. Este assunto tem gerado muita polêmica e várias intervenções do judiciário, embargando e liberando a obra.
O primeiro ponto de discussão é com relação ao local onde o aterro está sendo construído. O terreno comprado pela Ponta Grossa Ambiental (PGA), empresa contratada pela prefeitura para realizar a obra, fica na Área de Preservação Ambiental (APA) da Escarpa Devoniana, localizada a 16 quilômetros do centro de Ponta Grossa. Pra facilitar a localização do leitor, a área fica a menos de um quilômetro, à direita, depois da entrada para a cachoeira do Rio São Jorge, no sentido Ponta Grossa - Alagados.
Essa localidade é uma das mais exuberantes da região dos Campos Gerais, com escarpas, canyons, furnas, fendas, cavernas, lagoas, relevos ruiniformes em arenito, que abriga uma rica biodiversidade.
Além disso, o aterro situa-se sobre a área de recarga do Aquífero Guarani, maior manancial de água doce subterrânea fronteiriço do mundo (ocupa uma área de 1,2 milhões de km², estendendo-se pelo Brasil, Paraguai, Uruguai e Argentina). Estima-se que o Aquífero Guarani possui uma reserva de água da ordem de 45.000 km³.
Essas características demonstram claramente que a área escolhida é imprópria para a construção de um aterro. Mesmo assim, caro leitor, a prefeitura liberou o alvará para a obra. Mais estranho ainda é o fato de que o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) também deu parecer favorável ao aterro, descumprindo, inclusive, uma recomendação do Ministério Público Federal (MPF).
O segundo ponto polêmico neste projeto é o § 3.º do Art. 1.º da Lei n.º 9371/2008 que dispõe sobre a concessão dos serviços públicos de limpeza pública, tratamento e destinação final dos resíduos do Município de Ponta Grossa:
"§ 3º. Poderá ser dada destinação final a resíduos provenientes de outros municípios do Estado do Paraná, de acordo com os seguintes critérios:
I. no caso de resíduos de serviços de saúde, tratados e descaracterizados, estes poderão ser dispostos no Aterro Controlado do Botuquara, ou em novo aterro sanitário a ser construído em terreno doado pelo Município e com operação paga pelo contrato de concessão, com os custos de disposição pagos pela concessionária;
II. no caso de resíduos sólidos urbanos domiciliares, estes poderão ser dispostos no Aterro Controlado do Botuquara, ou em novo aterro sanitário a ser construído em terreno doado pelo Município, com operação do aterro paga pelo contrato de concessão, somente sob autorização do Município;
III. no caso de aterro sanitário privado que venha a ser implantado e operado integralmente às expensas da concessionária, será autorizada a disposição de resíduos de qualquer tipo provenientes de outros municípios, ouvidos os órgãos ambientais estadual e municipal competentes."
I. no caso de resíduos de serviços de saúde, tratados e descaracterizados, estes poderão ser dispostos no Aterro Controlado do Botuquara, ou em novo aterro sanitário a ser construído em terreno doado pelo Município e com operação paga pelo contrato de concessão, com os custos de disposição pagos pela concessionária;
II. no caso de resíduos sólidos urbanos domiciliares, estes poderão ser dispostos no Aterro Controlado do Botuquara, ou em novo aterro sanitário a ser construído em terreno doado pelo Município, com operação do aterro paga pelo contrato de concessão, somente sob autorização do Município;
III. no caso de aterro sanitário privado que venha a ser implantado e operado integralmente às expensas da concessionária, será autorizada a disposição de resíduos de qualquer tipo provenientes de outros municípios, ouvidos os órgãos ambientais estadual e municipal competentes."
Quem de vós, nobres leitores, gostaria que o lixo de todo o seu bairro fosse jogado no jardim da sua casa? Certamente ninguém. Mas, guardadas as devidas proporções, é exatamente isso que Ponta Grossa está fazendo! Muito generosamente ela está permitindo receber o lixo de outras cidades do Paraná.
Não é de se espantar que isso aconteça? Seria coincidência o fato de a referida lei ter sido promulgada meses antes do previsto esgotamento da capacidade do aterro da Caximba, que recebe os resíduos orgânicos de Curitiba e de mais 15 cidades da região metropolitana? Seria coincidência, também, os prefeitos de Ponta Grossa e Curitiba serem do mesmo partido (PSDB)? Que interesses estariam motivando este gesto de bondade de quem aprovou e sancionou a lei pra com a capital do estado?
Em recente entrevista na Rádio Tropical para o jornalista Altair Ramalho, o Sr. Beto Richa, prefeito de Curitiba afirmou que não existe a possibilidade de Curitiba descartar seus resíduos em Ponta Grossa. Ora, todos sabemos que promessa de político não se leva a sério!
A negativa do prefeito de Curitiba é contraposta pelo presidente do IAP, Sr. Vitor Hugo Burko. Em debate realizado numa rádio local, no último dia 12, ele foi incisivo em dizer que se houver uma "situação de emergência" em Curitiba, "o lixo vai vir para cá, e ninguém vai impedir".
O Sr. Burko tem razão. Se a lei permite, ninguém poderá impedir. E a PGA sabe disso. Tanto sabe que o projeto do aterro prevê o recebimento de três mil toneladas diárias de resíduos, enquanto Ponta Grossa gera somente 160 mil toneladas por dia, ou seja, quase 19 vezes menos do que o previsto pela construtora.
Como podemos perceber, há muita coisa obscura em toda essa história. É no mínimo estranho que um aterro sanitário, por mais moderna que seja a tecnologia empregada, seja construído numa Área de Proteção Ambiental e sobre o maior manancial de água doce subterrâneo do mundo. Além disso, é inadmissível que Ponta Grossa se transforme na "capital do lixo do Paraná".
Para concluir, quero compartilhar uma reflexão que enviei esta semana para o Diário dos Campos (publicada em 19/09/2009) e para o Jornal da Manhã (publicada na edição de hoje, domingo):
Ponta Grossa é uma cidade muito peculiar. Elegeu quatro deputados estaduais mas apenas um deles (Péricles de Mello) tem se manifestado contrário às obras do aterro. Onde estão os demais representantes de nossa cidade na Assembléia Legislativa? Qual é a opinião deles a respeito? Pior que isso: onde estão os ponta-grossenses que também não se manifestam? As autoridades estão deixando claro que irão trazer o lixo de todo o estado para Ponta Grossa e ninguém fala nada? Somente a ACIPG e outras poucas entidades têm se manifestado contrárias a esse projeto humilhante para a cidade e afrontoso à nossa inteligência. Parabéns ao Djanuzi Fontini Reis que, como membro do Conselho Municipal do Meio Ambiente, tem dado a cara a tapa sobre este tema, sempre em defesa da cidade. Sua voz tem que continuar ecoando. Como disse Martin Luther King, assassinado em 1968 em defesa da paz e dos direitos humanos: "O que me preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem-caráter, nem dos sem-ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons."
Pense nisso!
Referências bibliográficas:
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